recentemente me deparei com o termo cacareco girl. ele nada mais é do que um abrasileiramento da chamada trinket person – alguém que nutre um fascínio por chaveiros, correntes, botões, sylvanian families ou qualquer outro objeto pequeno e único. a jane birkin é a maior cacareco girl de todos os tempos, tanto que jane birkinfying é outra expressão pra customização de artefatos. observe uma das bolsas dela:
depois que descobri as cacareco girls senti um grande abraço maternal-cibernético-futurista. sou uma pessoa que coleciona muitas coisas. adesivos, apetrechos católicos, bibelôs, bonecas de porcelana, chaveiros, fitas, botões, cartões-postais, latas, amostras de perfumes e ursinhos de pelúcia (só pra nomear alguns). meu quarto é um grande depósito de tranqueiras. só não sabia direito como tirá-las da gaveta e colocar na vida real. as cacareco girls têm me ajudando nisso.
como estou em um período de ressaca literária e sem paciência pra assistir filmes e séries, acabei desenvolvendo um hobby muito perigoso: procurar coisas pra comprar na internet. pra você ter ideia, eu tenho uma lista enorme de mimos pra mim e pra todas as pessoas que amo. só que eu não tenho dinheiro sobrando e esse hábito de querer comprar e não poder virou um sofrimento tão grande que comecei a sonhar com bombas, torturas, segunda guerra mundial, perseguições entre outras situações bem tranquilas, graças a deus (já estou tratando tudo na terapia, obrigada pela preocupação).
como disse, algumas criadoras de conteúdo têm me ajudado nessa questão de autoexpressão, principalmente através da moda. sou tão perfeccionista que nenhuma ideia parece boa o suficiente pra usar, então só coloco uma calça marrom, uma blusa preta e vou viver a minha vida. é legal ver gente autêntica fazendo autenticidades. algumas compram coisas tão legais que eu também queria ter… outras fazem coisas tão legais que eu também queria fazer…
é aí que meu espírito marxista começa a falar alto. tudo custa dinheiro e isso me mata. muitas pessoas (eu) veem essa prática como uma forma de cuidar da criança interior. mas será que é comprando inutilidades que a gente cura o que precisa ser curado? acredito que é possível fazer isso sem cair no consumismo exacerbado. talvez ir a um parque de diversões que você nunca pode ir, aprender a fazer suas comidas preferidas daquela época, voltar a praticar algum esporte que você amava, assistir zack & cody de novo. sei lá.


eu era uma criança de quase 5 anos de idade quando luiz inácio lula da silva assumiu pela primeira vez a presidência do brasil. escrevi uma cartinha pra ele com a minha letra de criança de quase 5 anos pedindo que todas as crianças pudessem estudar e que não existisse fome no brasil. sim, era pra eu ter sido uma espécie de che guevara da geração z, mas aqui estou, escrevendo uma newsletter frustradíssima pra você porque não posso comprar um chaveiro de 200 reais do alexandre pavão.
você pode argumentar que é só fazer meu próprio cacareco. NÃO. eu não consigo. eu não sei combinar cores e objetos. eu sofri a semana inteira pra fazer um cartãozinho da newsletter pra divulgar por aí. olha o que vocês me fazem passar.
enfim. custa muito dinheiro pra pessoas sem criatividade e coordenação motora conseguir expressar quem são. preciso de outra pessoa que faça isso por mim. preciso apoiar artistas independentes com talento.
ser uma cacareco girl é, então, gastar dinheiro com bugigangas que, sendo bem realista, eu não preciso. e me dói não poder ter esse privilégio porque bugigangas, sabe-se lá o porquê, são importantes pra mim. elas de alguma forma contam a minha história e os meus interesses, e eu quero ser mais do que um nome aleatório na árvore genealógica da minha família. sabe-se lá o porquê. egocentrismo? medo de morrer e nada acontecer?
quando refleti sobre isso, me apareceu esse tweet e mandou o tema da minha newsletter semanal pro ralo:

é verdade, trata-se de coletar objetos significativos ao longo do tempo. mas coletar não necessariamente significa que eles são de graça. alguns vão custar dinheiro. talvez uma grande quantidade de dinheiro na atual economia brasileira.
nesse mês de dezembro são paulo é cheia de feirinhas de arte. fui em duas semana passada e gastei uma porção considerável que nem tinha tanta urgência assim. só porque era especial e eu gosto de apoiar artistas. que isso fique bem claro. não tem nada a ver com consumismo impulsivo. não tem nada a ver com consumismo impulsivo. não tem nada a ver com consumismo impulsivo (estou me auto-hipnotizando).
como sou muito revolucionária, aqui vai a minha proposta pra um mundo melhor: todo milionário deve adotar um mero mortal e bancar a vida dele. só assim pra eu conseguir fazer tudo o que quero fazer nessa vida.
se eu tivesse dinheiro sobrando…
★ compraria o chaveiro de 200 reais do alexandre pavão
★ seria saudável, pois faria pilates todos os dias, teria um personal trainer e contrataria um cozinheiro especializado em comida vegana saudável
★ faria aulas de cerâmica
★ viveria viajando tal qual a cantora nas horas vagas, dua lipa
★ faria cursos da ebac
★ escolheria viver da arte
★ comeria pizzas de 100 reais
★ compraria o livro the art of memory collecting, da cacareco girl martina calvi, que custa quase 300 reais (viu como é caro ser uma cacareco girl?)
★ moraria no edifício parque das hortênsias, do artacho jurado (meu arquiteto favorito)
sou uma menina de vontades simples.
nota 1: eu acho que muito do que pensei vai de encontro com esse texto maravilhoso da marina sá do entre lugares sobre os problemas da tendência i’m just a girl. vale muito a pena ler. dito isto, a música just a girl do no doubt é muito boa.
nota 2: escrevi esse texto sob os efeitos do alprazolam. espero que tenha algum sentido.
ai cara, eu sofro tanto em não poder me expressar de forma externa...... mesmo eu tendo capacidade de fazer minhas próprias coisas, até reciclando – na situação financeira de classe E em que estou – se torna um luxo. :(
tempos difíceis para sonhadores. que ódio, cara. que ódio que ódio que ódio que só nos resta sonhar, sabe? me dói muito. não só isso claro. o fato de que às vezes eu me consolo em não ter cacarecos porque estou ocupada pensando nas comidas que tenho que preparar e do quão cansativo/difícil é tentar se cuidar minimamente morando e se bancando sozinha. aaaaaa desabafo, perdão
meu sonho era ser uma cacareco girl tal qual jane birkin, mas realmente falta um milhão de reais na minha conta pra isso!!! inclusive, que honra ser citada no anna's void hihihi adorei o texto!